quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Hoje
















Hoje foi um dia animador. Nada como um lindo dia de sol na serra, e mais ainda, essa magnífica lua cheia, com céu estrelado e sem uma nuvem. Podia ser sempre assim. Podia ter sido sempre assim. Ainda não entendo exatamente por que isso tudo aconteceu. Dá até para esquecer por alguns momentos quando sinto esse cheirinho de jardim que só sente quem sobe a serra. Mas são breves momentos. Agora há poucos minutos eu estava com a minha família, cada um contando os acontecimentos do dia. Patricia (minha irmã) veio do Rio e passou o dia no abrigo da Igreja Metodista, muito bem cuidado pela minha amiga Michelle. Tudo limpíssimo, organizado e ainda muito bem abastecido, graças aos esforços incansáveis que vem de toda a parte do país. Nunca se viu uma mobilização tão grande! Isso prova que as pessoas de bem estão em quantidade bem maior do que as pessoas que não valem um segundo sequer do nosso pensamento.


Patricia é pediatra. Atendeu às crianças, organizou as prescrições e medicamentos, e ainda viu alguns adultos. Amanhã ela vai com duas auxiliares de enfermagem, voluntárias, para a escola agrícola de Venda Nova. Lá tem 130 pessoas, e a diretora Andrea ficou felicíssima com a possibilidade de ter uma pediatra lá amanhã o dia todo. A Patricia também escutou todo tipo de história - resgates, perdas, salvamentos e mortes. As pessoas ainda estão tendo a necessidade de falar. Ela entendeu o que eu queria dizer quando eu falava que quem não viu (ao vivo), ou quem não tem o coração na serra, não tem a dimensão exata do que significa mais de 700 mortos (talvez nunca se chegue ao número exato) e milhares de desabrigados na nossa região.


Hoje, quando fui a Ponte Nova, já senti na carne o êxodo rural. As pessoas não têm onde morar na roça. Além disso, incontáveis lavouras se tornaram improdutivas e incontáveis estabelecimentos comerciais perderam tudo e tiveram que fechar as suas portas. Além disso, diversos sítios, fazendas e haras simplesmente não existem mais. Temo que o interior vire uma imensa "cidade fantasma". Espero que o governo estadual/municipal não se esqueça disso. Eu vinha de Ponte Nova por Sebastiana para chegar em Vargem Grande sentindo isso, quando me ligou o meu grande amigo, colega de profissão, coordenador da Veterinária na UNIFESO e companheiro de diversos momentos difíceis da minha vida - André. Conversamos longamente sobre essa questão. Muitos alunos da faculdade estão com medo de retornar à cidade, ou seus pais estão passando por grandes dificuldades financeiras por terem perdido tudo. É impressionante, mas parece que todo mundo perdeu tudo - seja material, afetivo ou emocional. De alguma forma, cada habitante de Teresópolis perdeu alguma coisa ou muita coisa.


Falei anteriormente que foi um dia animador porque vi máquinas trabalhando, estradas desobstruídas, pontes quase refeitas e o sol lindo na serra. Vi também que todas as minhas amigas estão super empenhadas ajudando. Não me canso de exaltar a solidariedade que tomou conta do País inteiro. No fim do dia chegou o Russo com uma kombi cheia de coisas doadas por amigos e também por funcionários da Holos, do Lorenzo. O coitado do Russo chegou tardíssimo porque a combi quebrou na estrada, mas chegou! Como era tarde, deixei para entregar amanhã em Sebastiana, região que me parece a mais esquecida dos lugares por onde ando. Amanhã também tem mais coisa da Edith. O Russo ficou impressionado com o trânsito de caminhões com donativos subindo a serra.


Terminei o dia comprando vassouras, rodos e baldes, artigos de luxo que estão em falta em Sebastiana. Acho que adotei Sebastiana. Fico arrasada quando tenho pouca coisa para levar para lá. Tem um pessoal nota 10 - a Glória e o Jaime (que hoje estavam em uma reunião na prefeitura), e o Alexandre, dono do bar e da garagem que usamos para triagem dos donativos, montagem das cestas, cadastramento dos "moradores" e finalmente, distribuição. O Alexandre tem essa bar há 16 anos, e conhece todo mundo por lá. Cada um que chega, ele me diz: "Esse é o seu fulano, que mora na Gamboa, deve ter andando uns 8 quilômetros para chegar aqui, e tem 4 filhos" - e sai falando os nomes dos filhos.


Na volta para casa, encontrei a Patricia, que saía do segundo abrigo que ela foi, e compramos carne para levar no abrigo do Meudom, onde deve ter uns 300 alojados. Eu tinha recebido uma mensagem da Aline dizendo que eles não tinham nenhuma carne para colocar no jantar de hoje. O Walter, amigo meu de colégio e que atualmente mora em São Paulo, foi o generoso patrocinador dessas compras de hoje. Saindo desse abrigo, que fica em um galpão no alto de um morro no Meudom, tive a vista do morro do outro lado da estrada. E fico mais triste ainda de saber que a maior parte das regiões afetadas não fica em áreas de risco - ou seja, é como se um meteoro tivesse caído do céu aleatoriamente em algum lugar da Terra. Só que esse lugar da Terra foi justamente na minha querida Terê.

2 comentários:

  1. Oi Paulinha
    È por ter pessoas como vc(e outras mais), que não podemos perder a esperança nunca!
    Seu objetivo de vida é compartilhado por mim!
    Conte comigo!
    Bjs
    Marina Didonet( mãe da Tati)

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  2. Obrigada Marina! A participação de todos é de extrema importância!!!!! Tem muita gente ajudando!
    bjs

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